O dia 2 de junho de 1985 amanheceu diferente para os adolescentes que iam para a escola, apressados pelos pais, tomando café em dois goles, levando o pedaço de pão em uma mão e, com o outro braço, colocando a mochila pesada nas costas.
Quando não ouviam o programa Manhã Bandeirantes, do José Paulo de Andrade, ou o Jornal da Manhã, da Jovem Pan (“repita”, na voz de Roberto Muller), sintonizavam as saudosas baladas da Rádio Manchete, 91,3. Naquele dia, tocava uma música lançada na véspera, que dava nome a um novo álbum: Hunting High and Low, do grupo norueguês a-ha.
Hiiiigh, there’s no end to the lengths… Essa frase dizia muita coisa para a juventude da época. Era inspiradora, com os falsetes limpos e as notas altas cantadas por Morten Harket. O trio se completava com Paul Waaktaar-Savoy, guitarra e letras, e Magne Furuholmen, teclados, que já tocavam juntos na banda Bridges.
O nome do grupo tem uma conotação mundial. Veio de uma interjeição, a-ha, em tom de descoberta, que Furuholmen encontrou em um caderno de Savoy. Gostaram do som do termo, fácil de lembrar, com sonoridade internacional. Decidiram: seria esse o nome da banda.
Suas melodias, desde o início, carregavam esse espírito de revelação. Cruzaram fronteiras, muito além da Noruega, país que ajudaram a colocar de vez no cenário da música pop.
There’s no end to the lengths. Não há limite para os meus esforços… Qual estímulo melhor do que esse, embalado por uma melodia que guiava o jovem diante dos desafios da vida?
Qualquer apaixonado se sentia capaz de conquistar a menina amada. A ideia de fracasso parecia sucumbir, e até tirar 10 em Matemática se tornava algo possível.
O encanto do som tinha o dom do devaneio real. Ouvir cada estrofe dava cores alegres ao dia a dia. O adolescente da época, com ela, se via em uma praia, no Rio, ou em uma praça com amigos, entre os prédios de São Paulo, com a alma alimentada de confiança.
Até a solidão da noite, no escuro do quarto, era aquecida por um sentimento acolhedor, quando a música tocava no rádio ao lado da cama. Causava um impacto tão positivo que fazia até o mais tímido dizer em alto e bom som: Here I’m.
Hunting High and Low completou 40 anos neste dia 1º. Além da faixa-título, eternizou o sucesso Take On Me, entre outros, marcando uma verdadeira revolução no mundo dos clipes, com cenas dinâmicas que se sucediam em traços desenhados à mão, como sonhos ganhando forma.
Poder do clássico
Não houve muito barulho em torno da data. Nenhuma comemoração especial na mídia. A banda não está mais ativa, mesmo depois de o reencontro em 2022 para o Rock in Rio Lisboa. Harket já lançou alguns álbuns solo.
Mas o maior tributo de um clássico é o seu poder atemporal. Os cinquentões de hoje que o digam. Cada vez que escutam Hunting High and Low, algo interno estremece. O jovem de outrora conversa com o adulto, quase idoso. Ele até tenta segurar o tempo, com os punhos fechados.
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Em vão. Em suas mãos vazias, apenas o ar. Na mente, a lembrança das mochilas e das idas apressadas à escola. Com aquela música ao fundo.
A resposta está nos acordes. Eles não explicam. Apenas confortam, de alguma maneira.
Afinal, o que é a vida, senão a companhia de uma bela canção?
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